terça-feira, 24 de julho de 2012

Web Novela - A Melancolia de Raymond - 10


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Um dia Robert me disse que queria escrever uma história sobre a minha vida.
Como assim?, eu perguntei. Não há história em minha vida. São dias desolados, sem emoção alguma. Quem leria uma obra tão catastrófica e bizarra?
Ele deu de ombros, indiferente, e disse que escreveria ainda assim. Me perguntou se eu leria, e eu confirmei, obviamente. Não por vontade. Por educação, por admirá-lo como pessoa, não como escritor, por ser seu amigo. E por se tratar de uma coisa sobre mim, é claro, o maior de todos os fatores. Eu pensei tudo aquilo, mas disse a ele apenas que sim, eu leria, e ele me disse que, nos tempos atuais, já seria o suficiente.
Às vezes, quando eu me sentia sozinho (o que, em suma, era a minha realidade na maior parte do tempo), contava a Robert sobre Camila. Ele a viu uma vez, quando eu a ensinava algumas manobras básicas de skate. Disse que ela parecia uma patricinha sem rumo e sem personalidade, mas eu a defendi, erroneamente. Era isso o que ela era: uma filha de ricos fujões, movida por um modismo que a levou até o abismo, já que nada da estética e da moda sobrevivera ao caos do conflito. Mas eu a defendi mesmo assim.
Então ele riu, babaca. Disse que eu estava apaixonado, e eu respondi com o dedo médio em riste. Eu não estava apaixonado! Ela era somente uma garota magricela! Eu tinha sexo quando tinha vontade, encontrava alguns dólares na rua e alugava uma prostituta ou comprava uma revista pornográfica de um mendigo qualquer, sei lá. Quem precisa de uma mulher? Quem precisa de uma companheira fixa?
Refletindo sobre isso, vi o quanto ela me fazia bem. Ela estava lá, ao meu lado, conversando sobre as coisas que eu mais gostava, ou o que sobrara delas. Como Robert, que era meu amigo, meu melhor amigo. Como ele, porém em menos tempo, em meses, como ele fazia há anos. Seria verdade? Eu estava mesmo sentindo algo por ela?
Disse a mim mesmo que não, e então me virei, mas não sem antes escutar a piadinha infame sobre o livro da minha vida se tornar um belo romance dramático de merda. Acenei um foda-se para Rob, e então parti, vagando pensativo no quão sofrível poderia ser a vida de meus amigos, ingênuos quanto à mágica que habitava minha existência, se a caçada que marcou meu corpo fosse guiada de modo a ferir aqueles que me circundavam.
Eu precisava ser forte.
Precisava defendê-los, como não pude fazer ao meu pai e à minha mãe.

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