Eu
sempre gostei de escrever.
Desde
pequeno, quando mal sabia contar as primaveras de minha vida, eu amei as
palavras. Admirava as letras que se uniam para compô-las, entoando uma canção sem
ritmo, certas vezes rítmica demais, declamando poemas de rimas ou sem elas, e
eu as admirava ali, sentado com um livro aberto nas mãos, ainda com dificuldade
para ler todos aqueles universos. Era tão maravilhoso imaginar, deixar a mente
correr solta, livre e desimpedida, alcançar limites muito além dos meus,
limites nascidos da imaginação de outros, de infindáveis autores cujos esforços
permitiram nobres proezas que me guiavam ao infinito, em ida e volta, em puro
êxtase.
Um
dia, decidi me aventurar. As palavras ainda eram inimigas, obviamente, mas eu
já as riscava em folhas brancas, dobradas ao meio, contava meus clichês em
tantos pontos e vírgulas que mal se podia ler, mas eram minhas histórias, meus
dizeres, vidas e mais vidas saídas de minha imaginação, dobradas numa boneca de
livreto, tão falsa e tola, tão linda e amável. Eu não era bom, não era nada,
mas era feliz, feliz demais, e mais feliz me tornava a cada nova história, a
cada nova folha dobrada, a cada caneta que se acabava.
Foi
quando me aventurei, de uma vez por todas, num mundo só meu. Era uma terra
grandiosa, grande até demais, e ela abrigou dezoito meses de emoções,
garantindo-me adrenalina num roteiro sem estrutura, que me surpreendia a cada
novo capítulo, e lá estava ele, tomando forma num manuscrito que, hoje, é mais
do que um tesouro, algo que guardo em minhas gavetas como a maior riqueza que
hei de possuir. Oitocentas páginas mostraram-me que sim, eu poderia ser como
eles, poderia ser um deus em meu próprio mundo, e então eu o fiz, e continuei a
fazer, e decidi que para sempre o faria.
Escrevi
mais e mais, escrevi muito, por mais que poucos lessem. Amigos críticos,
companheiros virtuais, leitores em sites de postagens digitais, eu fiz o
possível, eu fiz mais que o possível, eu fiz
o que tinha vontade de fazer, e fiz por gostar, não por esperar nada em
troca, e decidi que sempre seria assim e que, por ser assim, seria melhor.
Escrevi e escrevi até os braços doerem, os dedos latejarem, a mente pulsar pelo
clímax de desfechos e brechas soltas, de pontas de livre continuidade e
introduções melancólicas, por situações aterrorizantes e por amores
correspondidos, ou não correspondidos, ou deixados ao vento pela perda
iminente.
Eles
morreram, eles viveram felizes para sempre, eles encontraram ou desencontraram
aquilo que mais procuravam, mas eu sempre encontrava o que procurava, pois procurava
por eles, por personagens, por companheiros, por vidas que inexistiam, mas para
mim sempre existiriam, nobres e impuras, tão vívidas quanto o mais real dos
reais seria incapaz de ser. Enquanto eles morriam e viviam, eu sorria e chorava,
com eles, por eles, por todos, e os via chorar e sorrir, como um filme, como
uma peça de teatro, como um amontoado de letras, palavras, frases e parágrafos.
Eu
era um pai, mas um pai de filhos incontáveis, um pai de deuses e guerreiros e
de seres mais velhos que eu, um pai realizado e orgulhoso de todas as suas
proles. Eles não me agradeciam, não viviam por mim, mas eu vivia por eles e os
agradecia por cada conquista, por cada vitória, por cada plano maquiavélico;
agradecia-os por respirar quando as páginas eram viradas. A cada final de dia,
quando meus olhos se fecham no repouso, ainda os vejo, vivos e mortos, felizes
e tristonhos, realizados ou sem esperança, cada qual em seu mundo, em sua
localidade, com culturas variadas, manias peculiares e vestimentas atípicas,
cada qual com sua existência inexistente, com seus amores e ódios, com suas
revoltas e glórias.
Por
essas e outras —por filhos, por mundos, por problemas e soluções de tantos
universos —eu amo o que faço, e o faço por amar, mais do que tudo, a liberdade
que somente as palavras podem garantir. Por essas e outras, por tudo aquilo que
realizei e hei de realizar na vida, mantenho-me na trilha do escritor, no rumo
dos contadores de história, no caminho imaginativo daqueles que sonham
acordados, que deslumbram o irreal em suas realidades, que fazem do surreal o
existente, material nas mãos de cada leitor, estampados virtualmente nas páginas
de um blog ou site, sólidos, rígidos, densos, tão leves quanto uma pluma
carregada pela brisa.
Por
essas e outras, por todas essas e por todas outras, que os incito e motivo a
escrever, a ler, a viver a fantasia de fantasiar a vida. Sejam escritores ou
leitores, tenham sonhos ou vontades, parabenizo a todos pelas letras, pelas
frases, pelas criações, e aplaudo de pé cada nova cena, cada nova alegria e
tristeza em nossas crias, cada vingança completa, cada amor encontrado. Aplaudo
o fantástico, a ficção, pois somente assim toda a sua irrealidade se torna
real, vive ao nosso lado, inspira, respira e transpira por mundos e universos
que, por mais distantes que sejam, vivem abaixo de um mesmo céu.
Parabéns
a todos pelo dia do escritor.
Taubaté, 25 de julho de 2012.
Rodolfo Santos
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