Futuro ou Loucura?
Ela
me perguntou se eu podia ver o futuro.
Eu
talvez pudesse, talvez não. Aquela mulher, no entanto, me ironizava. E, por me
ironizar, tinha um anseio mais que inoportuno por me tirar do sério, para assim
deslumbrar-se com minha raiva descontrolada, que seria descontada em sua pessoa
de maneira desordenada, mal-educada, e assim seria eu o vilão, não ela. Eu
falaria mal de suas palavras, ela se defenderia dizendo agir com ingenuidade.
Então eu falaria que ela estava zombando de mim, e ela diria que não, e nós
discutiríamos. A discussão atrairia muita gente, e essa gente toda me olharia
com desaprovação, criando assim uma divergência sem tamanho e, possivelmente,
forte o bastante para que durasse eternidades, por mais eternas que as eternidades
pudessem ser. Aí então eu tentaria me desculpar, mas já seria tarde demais, e
eu perceberia a armação quando a coisa toda estivesse contra mim, rolando numa
avalanche caótica, e o sorriso daquela mulher ficaria ali, irônico em sua
zombaria, e eu não teria mais sorriso algum. Todos aqueles cuja curiosidade
ordenou que ficassem para assistir virariam as costas para mim, sem motivo
justo ou razão de nexo aceitável, e eu então ficaria sozinho, eu e aquela
mulher, e ela daria de ombros, provocante, deixando-me a controlar a vontade
incomensurável de saltar sobre ela e esmagar a sua inocência malévola com os
meus punhos, coisa que jamais faria, obviamente, por mais que, em todo meu
devaneio de tirania, muitos agora pensassem que eu seria capaz. Aí eu iria embora,
mas logo precisaria de alguém, mas esse alguém não estaria ali, pois ninguém
mais estaria, já que eu havia me tornado um vilão em potencial, pois quem tem
coragem para agredir verbalmente uma mulher cuja pergunta não foi respondida é
capaz de fazer pior, de usar a força, de agir com brutalidade enfadonha de uma
fera tão medonha como somente o homem pode ser, e esse homem seria eu, alvejado
por todas as críticas, com dedos que miravam minha descrença e música
melodiando as infindáveis ofensas que me quedariam. E eu vi mais, vi além, vi
aquela mulher se fazer de vítima, se aproveitar de meu insucesso, discursar
abertamente sobre o homem que a humilhou, mas o homem que a humilhou podia ser
humilhado, e era, e eu seria por tantos anos, até que me esquecessem, ela mesmo
me esqueceria, ela e todos os outros, e então eu deixaria de ser lembrado e
apontado e alvejado por mentiras, me esconderia numa máscara da realidade
fantasiosa e voltaria a viver, sem rumo, sem trilha, sem vontade de existir, e
nunca mais ver o futuro, pois futuro algum existir na mente de alguém cuja
finalidade é apenas ser esquecido e relembrado.
Ela
me olhava sem entender, e eu disse que não, senhorita, eu não posso ver o
futuro. Mas tome cuidado com o seu.
E
fui embora.
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