quinta-feira, 16 de agosto de 2012

WN - Baile de Espíritos - 8


VIII

Era um casal apaixonado.
Abraçados, unidos pelo grande desejo daquele abraço, apertando-se um contra o outro, alegres, felizes, temerosos. Os corpos estavam unidos, os lábios bem próximos, as respirações, quando existentes, sentidas na pele do outro. Não havia nada senão amor, nada além de um sentimento inexplicável, que tem nome mas não forma, que tem cor mas não razão. Sem sentido, somente impulsos, assim eram eles, únicos, amantes, viventes.
Cadáveres.
Eu os encontrei no terraço de um edifício baixo. Os fantasmas estavam próximos, as mãos unidas, os dedos entrelaçados, os olhos serenos. Os corpos amorfos e espectrais vivenciavam por vezes a fuga desajeitada, a corrida incomensurável pelas escadarias, a porta que impediu a liberdade imediata, o ar que os recepcionou quando alcançaram o terraço.
Eu vi, nos olhos daqueles fantasmas, a tenebrosidade do ato que deu fim à vida de ambos.
Ciúmes, ou nada mais. Inveja da felicidade dos dois, uma felicidade que não poderia existir em meio àquele mundo caótico. Pelos sorrisos, pela alegria, os amantes pagaram um preço que pessoa alguma poderia pagar.
Morreram juntos e, como amantes, amavam.
Ficariam assim, unidos e apaixonados, por toda a eternidade, até que o infinito tornasse-se finito. Ficariam ali para sempre, ou mesmo até que o para sempre chegasse a um fim. Os momentos se passavam, girando os ponteiros dos relógios de maneira descontrolada, e as horas voavam, os dias terminavam, mas eles ainda estavam ali, unidos, amantes, amáveis, amando.
Sentada sobre uma saída da tubulação de ar, pude vê-los se desesperar quando o céu negro fez ventar, e o vento era peculiar. A brisa ríspida tornou-se um sopro voraz, trouxe consigo a morte aos mortos, o extermínio, a última passagem pelos portões do deixar de existir. Eles gritaram seus nomes, mas não pediam por ajuda.
Queriam ser lembrados, apenas.
Não seria eu a lembrar, infelizmente. Eles gritaram seus nomes antes de desaparecer, então se foram, dessa vez para sempre, e nunca mais retornariam, nem vivos, nem mortos, mas esquecidos, deixados para trás, tornados passado e não futuro.
Eu os recordaria, ao menos por alguns segundos.
Em lágrimas, vi-os dissolver no vento fúnebre, despedindo-se com um silvo de lamúrias, e então os esqueci e parti, sem que nada daquilo alterasse meu viver.
E eles desapareceram para sempre e, como sempre, unidos. Apaixonados; amantes, amáveis, amados.
Amando.

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