VIII
Era
um casal apaixonado.
Abraçados,
unidos pelo grande desejo daquele abraço, apertando-se um contra o outro,
alegres, felizes, temerosos. Os corpos estavam unidos, os lábios bem próximos,
as respirações, quando existentes, sentidas na pele do outro. Não havia nada
senão amor, nada além de um sentimento inexplicável, que tem nome mas não
forma, que tem cor mas não razão. Sem sentido, somente impulsos, assim eram
eles, únicos, amantes, viventes.
Cadáveres.
Eu
os encontrei no terraço de um edifício baixo. Os fantasmas estavam próximos, as
mãos unidas, os dedos entrelaçados, os olhos serenos. Os corpos amorfos e
espectrais vivenciavam por vezes a fuga desajeitada, a corrida incomensurável
pelas escadarias, a porta que impediu a liberdade imediata, o ar que os
recepcionou quando alcançaram o terraço.
Eu
vi, nos olhos daqueles fantasmas, a tenebrosidade do ato que deu fim à vida de
ambos.
Ciúmes,
ou nada mais. Inveja da felicidade dos dois, uma felicidade que não poderia
existir em meio àquele mundo caótico. Pelos sorrisos, pela alegria, os amantes
pagaram um preço que pessoa alguma poderia pagar.
Morreram
juntos e, como amantes, amavam.
Ficariam
assim, unidos e apaixonados, por toda a eternidade, até que o infinito
tornasse-se finito. Ficariam ali para sempre, ou mesmo até que o para sempre
chegasse a um fim. Os momentos se passavam, girando os ponteiros dos relógios
de maneira descontrolada, e as horas voavam, os dias terminavam, mas eles ainda
estavam ali, unidos, amantes, amáveis, amando.
Sentada
sobre uma saída da tubulação de ar, pude vê-los se desesperar quando o céu
negro fez ventar, e o vento era peculiar. A brisa ríspida tornou-se um sopro
voraz, trouxe consigo a morte aos mortos, o extermínio, a última passagem pelos
portões do deixar de existir. Eles
gritaram seus nomes, mas não pediam por ajuda.
Queriam
ser lembrados, apenas.
Não
seria eu a lembrar, infelizmente. Eles gritaram seus nomes antes de
desaparecer, então se foram, dessa vez para sempre, e nunca mais retornariam,
nem vivos, nem mortos, mas esquecidos, deixados para trás, tornados passado e
não futuro.
Eu
os recordaria, ao menos por alguns segundos.
Em
lágrimas, vi-os dissolver no vento fúnebre, despedindo-se com um silvo de
lamúrias, e então os esqueci e parti, sem que nada daquilo alterasse meu viver.
E
eles desapareceram para sempre e, como sempre, unidos. Apaixonados; amantes,
amáveis, amados.
Amando.
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