sábado, 4 de agosto de 2012

Web Novela - A Melancolia de Raymond - 15


XV

Os dias se resumiam a sexo e fugas.
Magos nos perseguiam, nós escapávamos. Quando livres, transávamos, e a vida era assim, repleta de adrenalina e inutilidades assexuadas. O sexo era o único remédio, e nós precisávamos nos dopar para esquecer aquela obscenidade assombrosa, para nos livrar da sensação inoportuna de coexistir na escuridão.
Eu matei.
Não uma vez, não dez. Matei dezenas. Matei para viver, matei para existir. Matei para proteger. Matei por mim, por Camila, mas também matei por Rob e por minha mãe, pela mãe de Camila, por meu pai.
Quando matei por meu pai, matei sem pensar, sem piedade. Vi sangue jorrar de meus oponentes, gostei daquela sensação. O gosto era saboroso. Não fora antes, mas agora era. Algo mudara no mundo. Precisamente falando, algo mudara em mim. Eu tive um mundo para viver, antes. Tinha uma vida ampla, cheia de oportunidades, cheia de escolhas. Agora, tinha Camila, e só. Tinha a morte e os mortos, e foda-se. Nada mais. Tinha o ar fétido, a comida podre, a bebida vermelha e fervente, e essa era proveitosa, um êxtase que não sabia explicar.
Peguei-me em convulsão numa manhã, despertado de meu transe pelo toque das mãos de Camila. Ela me perguntou se eu estava bem, e como eu poderia responder? Eu não estava bem. Nada estava bem. O gosto de sangue na boca, o sonhos cada vez mais cruéis, o grito engolfado na morte de cada um daqueles magos que me seguia.
Eu não estava bem com aquilo tudo.
Eu estava ótimo.
Camila tinha um tornozelo quebrado, e eu a auxiliava durante alguns dias. Nos outros, mandava que ela se fodesse. Não com palavras, não com gestos. Apenas a deixava caminhar sozinha, abandonada às traças, sem me incomodar. Deixava que ela sentisse a dor de seu corpo, o peso do fardo que era ela.
Um dia, peguei-me pensando assim, e chorei.
Quem era eu? O que estava acontecendo?
Eu não tinha respostas, mas tinha a morte, e ela era minha verdadeira companheira.
Assim sendo, matei, matei mais e mais, matei muitos, deixei seus corpos estraçalhados pelo chão. Mutilei-os sem perceber, não me arrependi. A dor era deles, não minha. A morte era deles, e o prazer era todo meu.
Entre os corpos, encontrei Camila.
Ela estava morta, e eu sequer sabia se era eu o responsável.
De qualquer forma, ela era apenas mais um corpo, mais uma morte. Um número, um resto. Eu estava vivo, não ela. Eu tinha de seguir. Eu tinha um caminho para continuar.
Ela ficaria para trás, e eu dei de ombros. Não faria diferença sem ela, faria? Eu sempre estive sozinho. Eu sempre estive no vazio.
Quando dei por mim, estava no escuro, abraçado ao frio da solidão.
Alguém me aplaudia.

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