XV
Os
dias se resumiam a sexo e fugas.
Magos
nos perseguiam, nós escapávamos. Quando livres, transávamos, e a vida era
assim, repleta de adrenalina e inutilidades assexuadas. O sexo era o único
remédio, e nós precisávamos nos dopar para esquecer aquela obscenidade
assombrosa, para nos livrar da sensação inoportuna de coexistir na escuridão.
Eu
matei.
Não
uma vez, não dez. Matei dezenas. Matei para viver, matei para existir. Matei
para proteger. Matei por mim, por Camila, mas também matei por Rob e por minha
mãe, pela mãe de Camila, por meu pai.
Quando
matei por meu pai, matei sem pensar, sem piedade. Vi sangue jorrar de meus
oponentes, gostei daquela sensação. O gosto era saboroso. Não fora antes, mas
agora era. Algo mudara no mundo. Precisamente falando, algo mudara em mim. Eu tive um mundo para viver, antes.
Tinha uma vida ampla, cheia de oportunidades, cheia de escolhas. Agora, tinha
Camila, e só. Tinha a morte e os mortos, e foda-se. Nada mais. Tinha o ar
fétido, a comida podre, a bebida vermelha e fervente, e essa era proveitosa, um
êxtase que não sabia explicar.
Peguei-me
em convulsão numa manhã, despertado de meu transe pelo toque das mãos de
Camila. Ela me perguntou se eu estava bem, e como eu poderia responder? Eu não
estava bem. Nada estava bem. O gosto de sangue na boca, o sonhos cada vez mais
cruéis, o grito engolfado na morte de cada um daqueles magos que me seguia.
Eu
não estava bem com aquilo tudo.
Eu
estava ótimo.
Camila
tinha um tornozelo quebrado, e eu a auxiliava durante alguns dias. Nos outros,
mandava que ela se fodesse. Não com palavras, não com gestos. Apenas a deixava
caminhar sozinha, abandonada às traças, sem me incomodar. Deixava que ela
sentisse a dor de seu corpo, o peso do fardo que era ela.
Um
dia, peguei-me pensando assim, e chorei.
Quem
era eu? O que estava acontecendo?
Eu
não tinha respostas, mas tinha a morte, e ela era minha verdadeira companheira.
Assim
sendo, matei, matei mais e mais, matei muitos, deixei seus corpos estraçalhados
pelo chão. Mutilei-os sem perceber, não me arrependi. A dor era deles, não
minha. A morte era deles, e o prazer era
todo meu.
Entre
os corpos, encontrei Camila.
Ela
estava morta, e eu sequer sabia se era eu o responsável.
De
qualquer forma, ela era apenas mais um corpo, mais uma morte. Um número, um
resto. Eu estava vivo, não ela. Eu tinha de seguir. Eu tinha um caminho para
continuar.
Ela
ficaria para trás, e eu dei de ombros. Não faria diferença sem ela, faria? Eu
sempre estive sozinho. Eu sempre estive no vazio.
Quando
dei por mim, estava no escuro, abraçado ao frio da solidão.
Alguém
me aplaudia.
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