quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Web Novela - A Melancolia de Raymond - 12


XII

Eu tive um pesadelo estranho naquela noite.
Sonhei que eu era culpado.
Culpado por várias coisas, por tudo, por nada. Culpado pelo infinito, pelo vazio, pelo vai e vem do destino. Culpado por existir, por interagir quando deveria enfiar minha cabeça num buraco e esperar o ar faltar para deixar aquele lugar, por não cuidar da mulher que sofrera horrores para evitar a minha morte, por não honrar o homem que morrera incapaz de se proteger apenas para que eu pudesse manter-me ali, vivo, existindo e prosseguindo numa caminhada sem sentido.
No meu sonho, via Robert e Camila, e eles sorriam, acenavam, me abraçavam e diziam coisas legais. Era um sonho, claro. Naqueles dias, ninguém agia daquela maneira. Ninguém era legal, ninguém falava coisas bonitas. Não havia nada bonito para se dizer, obviamente.
Havia sangue e morte por todos os lados.
Eu andei em ruas cinzentas, escutei o som do silêncio, dancei junto da solidão em pessoa. Olhava para os lados, nada via; olhava para o céu e sentia o frio sem esperança da vivência, esperando que as nuvens me privassem dos duros momentos de minha vida despejando sobre meu sofrimento um único lampejo, um raio que pudesse me tirar a dor, um golpe fulminante que me tiraria daquele lugar, me levaria do mundo e me postaria num lugar melhor, ou pior, mas que seria, ao menos, um outro lugar.
Acordei assustado, suava frio. Um mal pressentimento me assolava.
Levantei-me, vi minha mãe conversar com o fantasma de meu pai no espelho do banheiro. Era algo que ela fazia ao se sentir sozinha, nada fora do comum. Queria ser uma companhia melhor para ela, suprir a falta que ela sentia do meu velho, daquele homem que não era bruxo, que não era nada, mas eu também não era nada, mesmo que a mágica corresse em meus sangues. Eu estava ali como um número, somente mais um entre os sobreviventes, o resto da escória de minha raça, obstáculos numa guerra que jamais chegaria ao fim.
Sem me despedir, sem avisar ou cumprimentar, deixei minha casa para trás, sequer lavando o rosto. Peguei somente meu skate, deixei-o deslizar pelo solo acidentado, deixei-o carregar-me para longe, para qualquer lugar. Queria chorar, mas decidi que não choraria. Queria gritar, e isso sim poderia fazer, mas não ali, não onde minha mãe pudesse me escutar, não onde alguém pudesse me ver.
Quando longe o suficiente, parei, trêmulo. O grito já estava entalado em minha garganta num esforço inusitado para sair. Ele queria me abandonar, ecoar nos ares, agitar os corvos que assistiam meu sofrimento de sobre os destroços de um memorial.
Eu quis gritar, e só então encontrei um corpo no chão.
Poderia ser algo comum, poderia ser somente mais um corpo.
Mas não era.
Era o corpo de Rob.

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