quinta-feira, 21 de junho de 2012

Light Novel - Delirium - Caso 1 / Ato V

Olá, companheiros.
Trago hoje mais uma parte da Light Novel Delirium.
Espero que apreciem.
Até a próxima!



V

Trevor estava acostumado àquele tipo de situação. Era anormal, poucos conseguiriam aceitá-la com a mesma frieza demonstrada pelo psiquiatra. No entanto, era uma exigência de sua profissão, e logo aprendeu a congelar seus sentimentos.
“Onde estamos, doutor?”
Adiel estava desesperado. Enxergava-se manchado pelo sangue de sua amante, apavorando-se. Não tinha controle, não era o real culpado. Havia algo além.
“No espelho, oras. No espelho que disse a você para não mexer, se bem me lembro.”
“Eu sinto muito, a curiosidade me venceu.”
“Não sinta, Adiel. Não por isso. Sinta por sua família, pela donzela que fora sua amante. Sinta pelo mal que lhes fez.”
Adiel desabou em lágrimas.
“Por que todas essas crianças, doutor? Por que todos esses demônios?”
“Por que você matou. Matou uma criança, um feto. É ele quem o assombra. Ele é tudo o que você vê, amigo.”
“Então você os vê?”
“Precisamente.”
No meio de sua insanidade, Adiel comemorou.
“Talvez eu não esteja louco, doutor! Talvez eu só esteja perturbado por esses monstros! Tudo isso vai passar se eu me livrar deles, doutor Trevor! Eu vou ficar normal outra vez!”
Trevor pôde sorrir em resposta, e aquela era a melhor frieza que poderia demonstrar. No fundo, sabia a verdade.
Não havia volta: Adiel já estava morto há tempos.
“Você pode me ajudar, doutor? Pode me livrar destes monstros?”
“Por isso minhas consultas são tão caras, senhor Adiel.”
“Tire-os de perto de mim, por favor!”
“Será um prazer.”
Trevor era um psiquiatra, essa era sua profissão. Aquilo que lhe garantia um salário, sobrevivência e pacientes. Mas, na realidade, a especialidade de Trevor era outra. Imerso nos delírios de cada pessoa, desbravava as raízes de seus traumas, os males que rompiam suas sanidades.
Atirado contra os devaneios particulares de cada um de seus clientes, Trevor alcançaria a malícia do ser que os corrompia, livrando-os de enlouquecer por ver aquilo que não lhes era permitido entender.
Trevor Kraepelin era um ceifador e, como um, enfrentava os monstros da mente, antes que estes se tornassem monstros reais.
Porque monstros reais davam muito trabalho.
Usou de sua foice para destruir. Ela era enorme, tornava-o similar à figura da própria Morte, alastrava o sofrimento entre as coisas e os demônios como nada mais seria capaz de o fazer.
“Sabe que espelho é esse que você olhou sem permissão, senhor Adiel?”
Falava enquanto ceifava, coberto de sangue e nojeira, carregado por um odor nauseante.
“Não faço ideia, doutor.”
O paciente tremia, sentindo cada um de seus males ser desprovido da existência pela lâmina curva e infernal daquela foice.
“O Espelho da Verdade. Na realidade, apenas um fragmento deste.”
Livrou-se da última das criaturas, e então restaram apenas os dois na brisa infinita de um deserto igualmente infindável.
“O que aconteceu com o restante?”
“Se perdeu há muito tempo, meu amigo. Os homens não o suportaram. Não conhece a lenda?”
“Não.”
“Contam as histórias sobre um Espelho da Verdade, capaz de revelar a faceta desnaturada que há dentro de cada homem. Assim, os simples mortais, como nós, conseguíamos ver nosso interior, a malevolência que há dentro de nossos corações.”
“Que bela história, doutor. Seria interessante para os homens conheceram a si mesmos com perfeição.”
“Interessante, mas perturbador. Como foi ver sua própria verdade, senhor Adiel?”
“Terrível.”
“Viu pouco. Talvez já estivesse louco, ou coisa pior. Viu nada além do que fez.”
“O que poderia me matar, possivelmente.”
“Não poderia. Viu o que se passou, Adiel. Precisa ver quem é você.”
Outras coisas, outros demônios, e a foice rugiu outra vez, acompanhada de sua parceira, a Morte. Trevor se movia como uma dança, era ágil e forte.
Adiel assistia, pois era fraco e tolo, e precisava daquele homem para lhe ajudar.
Enquanto Trevor lutava, Adiel olhou para o céu. O céu cinzento, sombrio e tenebroso, relampejava como um espetáculo de luzes. Ali, Adiel viu seu reflexo, seu interior, sua realidade.
Desabou.
Trevor percebeu.
“Merda.”
A parte difícil chegara.

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