Como prometido, trago a partir de hoje uma nova Light Novel para vocês, entitulada Delirium. Espero que gostem do conteúdo. Lembrando que eu utilizei os mesmos moldes das Light Novel orientais, ou seja, diálogos com aspas no lugar dos travessões, bem como parênteses para pensamentos e outras coisas atípicas, como foi feito em A Balada do Caçador.
Sem mais demoras, confiram abaixo o ato Zero do Caso 1, Adiel Marcuse.
Caso 1
Adiel Marcuse
ZERO
Havia
uma mulher deslumbrante.
Ela
tinha um cabelo noturno, caído além dos limites de sua cintura, por vezes se
arrastando no solo. Os fios, soprados por um vento delicado e improvável,
desenhavam no ar com formas luxuosas e impressionantes, ora um dragão de traços
revoltosos, ora o inferno e todas as suas torturas.
“Você
pode me ver?”
Sua
voz era um cântico, entoada de maneira a parecer uma princesa fora de seus
trajes convencionais. Escapava por entre os lábios miúdos, parte maquiados,
parte naturais, exibindo a beleza de seus traços orientais. Os olhos eram
finos, tinham cores distintas. O verde parecia mundano, ainda que lindo; o
outro era anil, rutilava como magia.
“Pode
me ouvir?”
Ela
falava com aquele homem, mas ele não conseguia entendê-la. Suas palavras
pareciam sem sentido, ainda que o idioma fosse o mesmo. Era a consciência
daquele sonhador que não permitia a ele escutar aquela mulher. Seus olhos
desfocavam os lábios, sua mente se perdia longe dali. Conseguia admirar, e
apenas isso.
“Eu
preciso de ajuda!”
O
contemporâneo deixara suas marcas naquela mulher, na forma de um piercing miúdo
em seu lábio inferior, brincos transversais nas orelhas delicadas e tatuagens
que lhe cobriam dos ombros aos cotovelos. Os desenhos eram coloridos, traziam a
simbologia do oriente ilustrada na forma de um casal de tigres, um azul e um
vermelho, e flores multicoloridas.
“Escute-me,
eu preciso de ajuda!”
Parecia
prestes a suplicar, os olhos magníficos marejando pelo pavor. A prata de suas
pulseiras acompanhava o reluzir de seu rosto, e lá estava todo o encanto. O
homem demorou a perceber que ela estava nua, escondendo sua dignidade com os
braços, da maneira que lhe era permitido.
“Ele
está chegando, você tem que me ajudar!”
(Quem
está chegando?)
Pensava,
mas não conseguia obter resposta alguma. Sua mente não podia se afastar daquele
vislumbre, sua imagem era digna de um sonho irreal.
(Quem
é você?)
O
homem se esforçava para falar, mas sua voz ecoava apenas para si mesmo,
falhando ao tentar transpor as fronteiras de seus pensamentos.
(Onde
estamos?)
“Ele
está vindo! Ele vai nos matar!”
Suas
palavras pareciam dispersas, mas então assustaram o sonhador. Não queria
morrer, não queria permitir que ela morresse. Mas como poderia protegê-la, ou
mesmo proteger a si mesmo, se não tinha ideia do que acontecia?
(Por
que não me diz o que está acontecendo?)
O
céu estava lá, ainda que antes não estivesse. Escuro, tanto quanto o cabelo
daquela mulher, sem estrela alguma. Não havia nuvens, nem mesmo a lua. Parecia
apenas um manto negro atirado no teto de uma construção.
“Eu
tenho tanto medo!”
(Medo
de quem?)
“Ele
vai nos matar!”
(Quem
é ele? Quem vai nos matar?)
“Eu
não quero morrer!”
Ela
gritava, abafando mesmo os pensamentos daquele sonhador. Debatendo-se, como se
buscasse livrar-se de uma prisão invisível, notou que suas forças eram vagas,
um esforço similar ao de uma criança. Estava desgastado, fraquejando ante
aquele temor.
“Por
favor, eu não quero morrer!”
(Eu
também não quero morrer!)
“Não
me deixe morrer, por Deus!”
Era
estranho pensar em Deus naquela hora. O céu estava negro, o chão inexistia. O
que ele poderia fazer para salvá-los do que quer que fosse aquilo que se
aproximava?
(De
que adianta chamarmos por Deus?)
“Ele
está aqui!”
O
céu se partiu ao meio, como uma folha negra cortada por uma tesoura, mas um
relâmpago substituiu a lâmina. O trovão estrondou junto da luz, diferente das
normas da natureza, o clarão se manteve junto das pancadas que ribombavam no
céu sombrio.
(O
que está acontecendo aqui?)
“Salve-me!”
(Quem
é você?)
“Salve-me,
pelo amor de Deus!”
Algo
estava lá. Próximo dele, próximo dela.
Não
era Deus.
A
mulher desabou em lágrimas, entristecida pela fraqueza demonstrada.
Em
seus lábios, um sorriso malicioso surgia, camuflado pelo breu de seus cabelos.
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